Número do processo: 1.0137.06.000336-5/001(1)
Relator: EDUARDO MARINÉ DA CUNHA
Relator do Acordão: EDUARDO MARINÉ DA CUNHA
Data do acordão: 01/02/2007
Data da publicação: 15/02/2007
Inteiro Teor:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - REINTEGRAÇÃO DE POSSE - REQUISITOS - NÃO COMPROVAÇÃO - IMPROCEDÊNCIA. A ação possessória tem como finalidade a defesa da posse, em caso de esbulho ou turbação. Daí decorre que, para o manejo desta ação, devem estar devidamente comprovados a posse, sua duração e o esbulho ou turbação praticados pelo réu. Não demonstrados todos esses requisitos, o pedido possessório deve ser julgado improcedente. No juízo possessório é despicienda a discussão a respeito da titularidade do direito de propriedade.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0137.06.000336-5/001 - COMARCA DE CARLOS CHAGAS - APELANTE(S): KÁTIA MARTINS DA COSTA - APELADO(A)(S): MARIA ISABEL DE SOUSA PEREIRA - RELATOR: EXMO. SR. DES. EDUARDO MARINÉ DA CUNHA
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 17ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
Belo Horizonte, 01 de fevereiro de 2007.
DES. EDUARDO MARINÉ DA CUNHA - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. EDUARDO MARINÉ DA CUNHA:
VOTO
Conheço do recurso, eis que próprio, tempestivo, regularmente processado e preparado.
Mister se faz salientar que a posse é instituto bastante controverso, sendo discutidos, ainda hoje, sua natureza e conceito. Porém, a posição majoritária, tanto doutrinária quanto jurisprudencial, é no sentido de que o Direito Civil Brasileiro adotou a concepção de posse desenvolvida por Ihering, compreendendo a posse como exercício de fato de um ou alguns dos poderes inerentes à propriedade. Disso nos dá notícia o mestre Darcy Bessone, comentando o art. 485, do CCB/1916, que corresponde ao art. 1.196, do CCB/2002:
"No art. 485, o legislador, objetivamente, como pretendeu Jhering, tomou em consideração apenas o fato do exercício de algum dos poderes inerentes ao domínio, ou propriedade." (Direitos Reais. São Paulo, Saraiva, 1988, p. 229).
Mais à frente, aduz o eminente mestre:
A proteção possessória refere-se, assim, ao jus possessionis, abrangente dos direitos derivados da posse. Não é própria para o resguardo do jus possidendi, isto é, do direito de possuir, que cabe ao proprietário e pode caber ao titular de direito real sobre coisa alheia (...) ou mesmo ao titular de certos direitos pessoais (...). Assim, a ação reivindicatória, que visa a assegurar a posse ao dono, não integra a proteção possessória. A imissão de posse não é ação do possuidor, fundada no jus possessionis, mas, sim, ação do proprietário, fundada no domínio, e, por conseqüência, no jus possidendi.
Mas o que convém assinalar, aqui, é que a proteção possessória tem por objeto a posse em si mesma (jus possessionis), não, porém, o direito de possuir (jus possidendi). É ação de quem já é possuidor e é turbado ou esbulhado (ações de manutenção ou reintegração), ou tem receio de o ser (ação de interdito proibitório)." (Op. cit., p. 295-296).
No mesmo sentido, preleciona Astolfo de Rezende, em seu "Manual do Código Civil Brasileiro":
"Em resumo poderemos, pois, dizer que possuidor é:
1º - o dono, ou proprietário, que tem a coisa em seu poder, exerce de fato sobre ela os poderes inerentes ao domínio..." (aut. e ob. cits., vol. VII, Jacinto Ribeiro dos Santos, 1929, nº 10, p. 38).
Assim também as preciosas lições de Tito Fulgêncio:
"A posse é o exercício do direito de propriedade, é o aspecto normal, no dizer de IHERING, da relação do propreitário com a coisa, é a condição para a utilização econômica da propriedade, que consiste no uti, frui, consummere" (aut. ref., "Da Posse e das Ações Possessórias", vol. I, Forense, 4ª ed., nº 10, p. 12).
No tocante às ações possessórias, o art. 927, do Código de Processo Civil, dispõe que:
" Incumbe ao autor provar:
I - a sua posse;
II - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;
III - a data da turbação ou do esbulho;
IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse, na ação de reintegração."
Diante do texto legal, fácil é concluir que, para a procedência da recuperendae possessionis, deve a requerente comprovar, no processo, sua posse anterior, o esbulho praticado pela requerida, a data e a perda da posse.
Importa esclarecer que a ação de reintegração de posse consubstancia interdito passível de ser aviado por aquele que foi desapossado da coisa, injustamente, com o fim de reavê-la e restaurar a posse perdida.
Dispunha o art. 493, do Código Civil de 1916, que se adquire a posse "pela apreensão da coisa ou pelo exercício do direito". Nesse mesmo sentido, dispõe o art. 1.204, do Novo Código Civil, que "adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade".
Como se vê, em uma ação possessória, o que se verifica é a existência ou não do efetivo exercício de atos de uso e gozo - posse - tendo a requerente o dever de provar a sua posse anterior e a perda, por violência ou por ação oculta, observando Orlando Gomes que:
"(...) em caso de esbulho, a ação cabível é a reintegração de posse. Seu fim específico é obter a recuperação da coisa. Tem todo possuidor direito a consegui-la se da posse for privado por violência, clandestinidade ou precariedade" (in "Direitos Reais", Forense, 18ª ed., p. 91).
No caso em tela, as provas produzidas não são hábeis em demonstrar a posse da autora sobre o lote que teria sido invadido, em parte, pela ré.
Cumpre salientar que as próprias testemunhas arroladas pela autora, em momento algum afirmaram que ela exercera atos de uso e gozo sobre o lote.
Constou no depoimento da testemunha João Wilson Gomes da Fonseca que:
"(...) é vizinho das partes e por isso pode afirmar que houve realmente uma invasão da construção de D. Isabel no terreno de D. Kátia, sendo que, inclusive, à época, o depoente avisou D. Isabel que esta estaria adentrando em parte significativa do lote vizinho; (...) que o fato ocorreu em 1991; que quando tal fato ocorreu no lote de D. Kátia não havia qualquer construção desta pessoa, ou seja, de D. Kátia; e nem nada existia de plantação no local por parte de D. Kátia; (...) que o depoente nunca viu D. Kátia no terreno vizinho; que há 10 anos é vizinho de D. Isabel; que o depoente está sempre no local, já que trabalha na própria residência." (f. 103 - grifamos)
A testemunha Mauro Bispo dos Santos confirma a inexistência de atos da requerente que configurassem exercício de posse sobre a área remanescente do lote que a requerente se diz proprietária e possuidora. Confira-se:
"(...) que não se recorda se o lote vizinho ao de D. Isabel estava ou não sendo utilizado na época; que não pode afirmar com certeza, mas acredita que à época em que mediu a área que constatou a invasão não tinha qualquer construção de D. Kátia na área que sobrou do seu terreno." (f. 102).
A prova documental coligida aos autos, ao contrário do que alega a requerente, não tem o condão de demonstrar o exercício de sua posse sobre o lote que teria sido invadido pela requerida.
Sob esse aspecto, impõe-se frisar que a escritura pública de compra e venda que instrui a petição de ingresso (f. 5) demonstra que a requerente apenas celebrou com o proprietário do imóvel um negócio jurídico, por meio do qual pagaria o preço pactuado em contraprestação à transferência da propriedade, o que, diga-se, somente poderia se operar com a inscrição no registro imobiliário (art. 1.245, CCB/2002).
Mister frisar que, no juízo possessório, é despicienda a discussão a respeito da titularidade do direito de propriedade.
Nesse sentido é a lição de Maria Helena Diniz:
"Cabe ao proprietário do bem defender seu domínio contra quem, injustamente, o possua mediante ação de reivindicação. A posse, por sua vez, merece proteção legal por si mesma, independentemente da alegação do domínio. O Juízo possessório independe do petitório. Não se deve cogitar, em regra, em matéria de ius possessionis, que é um instituto jurídico autônomo, protegido por ações especiais, com a defesa do domínio, que é objeto de outra defesa processual." (Código Civil Anotado, 9ª ed.. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 764-765).
Destarte, não estando demonstrada a posse anterior da autora sobre a área em litígio, deve ser mantida a sentença vergastada, que julgou improcedente o pedido de reintegração de posse.
A propósito, confiram-se os seguintes arestos:
"APELAÇÃO CÍVEL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. PROPRIEDADE. AUSÊNCIA DE POSSE. INDEFERIMENTO DO PEDIDO.
I - Nos interditos possessórios, como a reintegração de posse, não se discute a propriedade, mas apenas a posse.
II - Restando comprovado nos autos que o autor não tinha a posse do bem, deve ser indeferido o pedido possessório." (TJMG, AC nº 1.0017.04.007499-3/001, rel. Des. Luciano Pinto, julgado em 15.9.2005).
"APELAÇÃO CÍVEL - CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO DE REINTEGRAÇAO DE POSSE - IRRELEVÂNCIA DA QUALIDADE DE PROPRIETÁRIO - AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 927 DO CPC - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1- Tratando-se de ação possessória, irrelevante é a qualidade de proprietário da parte ou a forma pela qual se deu a aquisição do imóvel, bem como a discussão ensaiada sobre conflitos relativos a divisas e às questões ligadas ao direito de propriedade, que nada se relacionam com a posse e com o seu exercício.
2- Para que o autor faça jus à concessão da proteção possessória, é imprescindível o preenchimento dos requisitos elencados no art. 927 do CPC, devendo provar satisfatoriamente a sua posse, assim como a turbação ou o esbulho sofrido, e, ainda, a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, e perda dela, quando se tratar de ação de reintegração. Na ausência de comprovação de qualquer um deles, a improcedência do pedido é medida que se impõe." (TJMG, AC nº 2.0000.00.466138-9/000, rel. Des. Maurício Barros, julgado em 26.10.2005)
Com tais razões de decidir, nego provimento à apelação.
Custas recursais, pela apelante.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): IRMAR FERREIRA CAMPOS e LUCIANO PINTO.
SÚMULA : NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0137.06.000336-5/001
Relator: EDUARDO MARINÉ DA CUNHA
Relator do Acordão: EDUARDO MARINÉ DA CUNHA
Data do acordão: 01/02/2007
Data da publicação: 15/02/2007
Inteiro Teor:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - REINTEGRAÇÃO DE POSSE - REQUISITOS - NÃO COMPROVAÇÃO - IMPROCEDÊNCIA. A ação possessória tem como finalidade a defesa da posse, em caso de esbulho ou turbação. Daí decorre que, para o manejo desta ação, devem estar devidamente comprovados a posse, sua duração e o esbulho ou turbação praticados pelo réu. Não demonstrados todos esses requisitos, o pedido possessório deve ser julgado improcedente. No juízo possessório é despicienda a discussão a respeito da titularidade do direito de propriedade.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0137.06.000336-5/001 - COMARCA DE CARLOS CHAGAS - APELANTE(S): KÁTIA MARTINS DA COSTA - APELADO(A)(S): MARIA ISABEL DE SOUSA PEREIRA - RELATOR: EXMO. SR. DES. EDUARDO MARINÉ DA CUNHA
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 17ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
Belo Horizonte, 01 de fevereiro de 2007.
DES. EDUARDO MARINÉ DA CUNHA - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. EDUARDO MARINÉ DA CUNHA:
VOTO
Conheço do recurso, eis que próprio, tempestivo, regularmente processado e preparado.
Mister se faz salientar que a posse é instituto bastante controverso, sendo discutidos, ainda hoje, sua natureza e conceito. Porém, a posição majoritária, tanto doutrinária quanto jurisprudencial, é no sentido de que o Direito Civil Brasileiro adotou a concepção de posse desenvolvida por Ihering, compreendendo a posse como exercício de fato de um ou alguns dos poderes inerentes à propriedade. Disso nos dá notícia o mestre Darcy Bessone, comentando o art. 485, do CCB/1916, que corresponde ao art. 1.196, do CCB/2002:
"No art. 485, o legislador, objetivamente, como pretendeu Jhering, tomou em consideração apenas o fato do exercício de algum dos poderes inerentes ao domínio, ou propriedade." (Direitos Reais. São Paulo, Saraiva, 1988, p. 229).
Mais à frente, aduz o eminente mestre:
A proteção possessória refere-se, assim, ao jus possessionis, abrangente dos direitos derivados da posse. Não é própria para o resguardo do jus possidendi, isto é, do direito de possuir, que cabe ao proprietário e pode caber ao titular de direito real sobre coisa alheia (...) ou mesmo ao titular de certos direitos pessoais (...). Assim, a ação reivindicatória, que visa a assegurar a posse ao dono, não integra a proteção possessória. A imissão de posse não é ação do possuidor, fundada no jus possessionis, mas, sim, ação do proprietário, fundada no domínio, e, por conseqüência, no jus possidendi.
Mas o que convém assinalar, aqui, é que a proteção possessória tem por objeto a posse em si mesma (jus possessionis), não, porém, o direito de possuir (jus possidendi). É ação de quem já é possuidor e é turbado ou esbulhado (ações de manutenção ou reintegração), ou tem receio de o ser (ação de interdito proibitório)." (Op. cit., p. 295-296).
No mesmo sentido, preleciona Astolfo de Rezende, em seu "Manual do Código Civil Brasileiro":
"Em resumo poderemos, pois, dizer que possuidor é:
1º - o dono, ou proprietário, que tem a coisa em seu poder, exerce de fato sobre ela os poderes inerentes ao domínio..." (aut. e ob. cits., vol. VII, Jacinto Ribeiro dos Santos, 1929, nº 10, p. 38).
Assim também as preciosas lições de Tito Fulgêncio:
"A posse é o exercício do direito de propriedade, é o aspecto normal, no dizer de IHERING, da relação do propreitário com a coisa, é a condição para a utilização econômica da propriedade, que consiste no uti, frui, consummere" (aut. ref., "Da Posse e das Ações Possessórias", vol. I, Forense, 4ª ed., nº 10, p. 12).
No tocante às ações possessórias, o art. 927, do Código de Processo Civil, dispõe que:
" Incumbe ao autor provar:
I - a sua posse;
II - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;
III - a data da turbação ou do esbulho;
IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse, na ação de reintegração."
Diante do texto legal, fácil é concluir que, para a procedência da recuperendae possessionis, deve a requerente comprovar, no processo, sua posse anterior, o esbulho praticado pela requerida, a data e a perda da posse.
Importa esclarecer que a ação de reintegração de posse consubstancia interdito passível de ser aviado por aquele que foi desapossado da coisa, injustamente, com o fim de reavê-la e restaurar a posse perdida.
Dispunha o art. 493, do Código Civil de 1916, que se adquire a posse "pela apreensão da coisa ou pelo exercício do direito". Nesse mesmo sentido, dispõe o art. 1.204, do Novo Código Civil, que "adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade".
Como se vê, em uma ação possessória, o que se verifica é a existência ou não do efetivo exercício de atos de uso e gozo - posse - tendo a requerente o dever de provar a sua posse anterior e a perda, por violência ou por ação oculta, observando Orlando Gomes que:
"(...) em caso de esbulho, a ação cabível é a reintegração de posse. Seu fim específico é obter a recuperação da coisa. Tem todo possuidor direito a consegui-la se da posse for privado por violência, clandestinidade ou precariedade" (in "Direitos Reais", Forense, 18ª ed., p. 91).
No caso em tela, as provas produzidas não são hábeis em demonstrar a posse da autora sobre o lote que teria sido invadido, em parte, pela ré.
Cumpre salientar que as próprias testemunhas arroladas pela autora, em momento algum afirmaram que ela exercera atos de uso e gozo sobre o lote.
Constou no depoimento da testemunha João Wilson Gomes da Fonseca que:
"(...) é vizinho das partes e por isso pode afirmar que houve realmente uma invasão da construção de D. Isabel no terreno de D. Kátia, sendo que, inclusive, à época, o depoente avisou D. Isabel que esta estaria adentrando em parte significativa do lote vizinho; (...) que o fato ocorreu em 1991; que quando tal fato ocorreu no lote de D. Kátia não havia qualquer construção desta pessoa, ou seja, de D. Kátia; e nem nada existia de plantação no local por parte de D. Kátia; (...) que o depoente nunca viu D. Kátia no terreno vizinho; que há 10 anos é vizinho de D. Isabel; que o depoente está sempre no local, já que trabalha na própria residência." (f. 103 - grifamos)
A testemunha Mauro Bispo dos Santos confirma a inexistência de atos da requerente que configurassem exercício de posse sobre a área remanescente do lote que a requerente se diz proprietária e possuidora. Confira-se:
"(...) que não se recorda se o lote vizinho ao de D. Isabel estava ou não sendo utilizado na época; que não pode afirmar com certeza, mas acredita que à época em que mediu a área que constatou a invasão não tinha qualquer construção de D. Kátia na área que sobrou do seu terreno." (f. 102).
A prova documental coligida aos autos, ao contrário do que alega a requerente, não tem o condão de demonstrar o exercício de sua posse sobre o lote que teria sido invadido pela requerida.
Sob esse aspecto, impõe-se frisar que a escritura pública de compra e venda que instrui a petição de ingresso (f. 5) demonstra que a requerente apenas celebrou com o proprietário do imóvel um negócio jurídico, por meio do qual pagaria o preço pactuado em contraprestação à transferência da propriedade, o que, diga-se, somente poderia se operar com a inscrição no registro imobiliário (art. 1.245, CCB/2002).
Mister frisar que, no juízo possessório, é despicienda a discussão a respeito da titularidade do direito de propriedade.
Nesse sentido é a lição de Maria Helena Diniz:
"Cabe ao proprietário do bem defender seu domínio contra quem, injustamente, o possua mediante ação de reivindicação. A posse, por sua vez, merece proteção legal por si mesma, independentemente da alegação do domínio. O Juízo possessório independe do petitório. Não se deve cogitar, em regra, em matéria de ius possessionis, que é um instituto jurídico autônomo, protegido por ações especiais, com a defesa do domínio, que é objeto de outra defesa processual." (Código Civil Anotado, 9ª ed.. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 764-765).
Destarte, não estando demonstrada a posse anterior da autora sobre a área em litígio, deve ser mantida a sentença vergastada, que julgou improcedente o pedido de reintegração de posse.
A propósito, confiram-se os seguintes arestos:
"APELAÇÃO CÍVEL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. PROPRIEDADE. AUSÊNCIA DE POSSE. INDEFERIMENTO DO PEDIDO.
I - Nos interditos possessórios, como a reintegração de posse, não se discute a propriedade, mas apenas a posse.
II - Restando comprovado nos autos que o autor não tinha a posse do bem, deve ser indeferido o pedido possessório." (TJMG, AC nº 1.0017.04.007499-3/001, rel. Des. Luciano Pinto, julgado em 15.9.2005).
"APELAÇÃO CÍVEL - CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO DE REINTEGRAÇAO DE POSSE - IRRELEVÂNCIA DA QUALIDADE DE PROPRIETÁRIO - AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 927 DO CPC - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1- Tratando-se de ação possessória, irrelevante é a qualidade de proprietário da parte ou a forma pela qual se deu a aquisição do imóvel, bem como a discussão ensaiada sobre conflitos relativos a divisas e às questões ligadas ao direito de propriedade, que nada se relacionam com a posse e com o seu exercício.
2- Para que o autor faça jus à concessão da proteção possessória, é imprescindível o preenchimento dos requisitos elencados no art. 927 do CPC, devendo provar satisfatoriamente a sua posse, assim como a turbação ou o esbulho sofrido, e, ainda, a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, e perda dela, quando se tratar de ação de reintegração. Na ausência de comprovação de qualquer um deles, a improcedência do pedido é medida que se impõe." (TJMG, AC nº 2.0000.00.466138-9/000, rel. Des. Maurício Barros, julgado em 26.10.2005)
Com tais razões de decidir, nego provimento à apelação.
Custas recursais, pela apelante.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): IRMAR FERREIRA CAMPOS e LUCIANO PINTO.
SÚMULA : NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0137.06.000336-5/001
FONTE: TJMG
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